4 de jun. de 2007

Dólares. Brasil.

Por Flavia Risi

Meu caro amigo,

“Me perdoe por favor, se não lhe faço uma visita...
Mas como agora apareceu um portador...”.

Sei que já faz muito tempo... 1984. Diretas Já. Nos sentíamos heróis ilustres dos livros de História. Robespierre. Che Guevara. Simon Bolívar e San Martín. É, nossos nomes estariam lá... Nas últimas páginas do livro; Aquela parte que é vista só no final do ano, depois de percorrer o pau-brasil, o açúcar, o café... O império, a República... Marechais, presidentes... Ditadura e, enfim, nós. Os revolucionários de 1984. Tínhamos 14 anos e na sua casa planejávamos como íamos transformar o Brasil. Ensaiávamos capas e vôos... Super-heróis. É, super-heróis brasileiros...
Hoje, meu amigo, a liga da justiça usa outra cueca. Lembra daquela sunga vermelha que vestiam sobre o uniforme? A nossa de hoje não é mais vermelha. Porém, igualmente poderosa: é cheia de dólares.
Nosso super-herói, aquele mesmo que acreditávamos, hoje parece gordo e cansado. Exausto até mesmo para saber das coisas que acontecem. A Liga foi desestruturada. Existe um traidor, ou mais. Traidores porque nos fizeram colocar nossas próprias capas neles e, hoje, não se lembram nem mesmo da cor delas.
É caríssimo amigo. Não estou otimista.
- Homens com dólares na cueca?
- Não estou otimista.
- Pagar R$ 44,00 só de assinatura de linha telefônica?
- Não estou.
- Dentro de 50 anos os recursos naturais da Terra estarão esgotados?
- Não.
- Mensalão, Sanguessuga, compra de votos, “little Rose” e “little Boy”... Chacinas, tráfico, meninos de rua e homens de rua, crianças fora da escola, crianças mortas de formas inumanas, fome, tristeza...
- É... Tristeza. Impossível ser otimista. Será que meu neto saberá o que é Amazônia?
Hoje você está longe. Sinto saudades de você e da nossa coragem. Da nossa esperança e daquela ilusão. Não só a pátria, mas, o mundo foi traído. Nem mesmos nós, com as camisas amarradas no pescoço em arriscados saltos em “vôos”, poderíamos fazer alguma coisa...
Ivete e eu continuamos os mesmos que você tanto conheceu. A pequena grande novidade, que este mês faz 2 anos, ainda lhe é inédita. Talvez por cauda dela o medo do mundo tenha se transformado em pânico. Não agüento mais as cores de nossos super-heróis e não agüento mais a ausência da nossa revolucionaria dupla encapada.
Não sei se você lembra do Caco... Aquele que tocava violão e era o encantador das mulheres?! Hoje é tucano e vereador. Sempre que vem aqui em casa há discussão. As verdades absolutas e a cara de pau dele quando se fala em política... Irritam.
O resto da turma, como eu, está casada e distante.
Sinto saudade de você caro amigo.
Sinto saudade de nos dois em 84.
Quando você vem nos ver?


Muitos abraços, carregados do nosso humor,


Augusto.

Leia a resposta da carta em: http://textosoficinauff.blogspot.com/2007/06/re-dlares-brasil.html

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