4 de jun. de 2007

A Moça de Paris

Por Lucas Waltenberg


Nunca havia visto ninguém passar tão rápido por mim. Estava frio em Paris e essa jovem moça, em seus vinte e poucos anos, veio em minha direção fumando um baseado e perguntou o que eu estava fazendo ali. Eu, que estava na margem do Rio Sena, respondi: “o mesmo que você”. Ela saiu imprimindo uma velocidade preocupante a seus pés; parecia atormentada.
Nunca havia visto ninguém passar tão rápido por minha vida e ficar marcado por tanto tempo. Em seguida, a moça andou cerca de quarenta metros, virou-se a começou a caminhar na ponte. Mas ela não foi diretamente até o outro lado. Parou no meio, voltou-se para o rio e abriu os braços, como se estivesse ansiosa para testar a temperatura da água. Eu, que ainda a retinha com o olhar, fiquei aflito e virei a cabeça para o outro lado, fechando os olhos. Aquele instante pré-suicídio me fez pensar no que havia acontecido para culminar com tão trágico fim. Nunca havia visto aquela moça antes, mas após uma súbita interpelação alguns minutos antes, ela era tudo o que me importava.
Então, dei-lhe um nome: Camille. E dei-lhe também um breve passado, pois a tensão do momento não permitia maior complexidade. Camille era francesa, mas não parisiense; veio de qualquer uma dessas cidades do interior que são bonitas, porém ninguém dá muita importância. O mais difícil foi caminhar de seu passado até o presente, para aquela situação na ponte. Nenhum motivo parecia justificável para Camille tentar suicídio. Mas talvez não houvesse mesmo acontecido algo significativo. Talvez a deixaram acreditar que sua presença no mundo não fazia mais sentido, que não era suficientemente querida ou que ninguém dava a devida importância à sua existência.
Ora, diabos! Eu me importo com ela. Eu conheço toda a sua história e não quero que ela se vá. Nunca vi ninguém passar por mim e querer ir embora tão rápido. Em segundos, pensei no que poderia fazer para que Camille desistisse da sua tentativa de me abandonar e abrir mão do mundo que construí para ela. Pensei em chamar alguém, gritar por socorro, ir correndo até ela e dizer em seu ouvido, baixinho: “fica”. Nem o Sena me escutaria, mas a moça que até pouquíssimos minutos atrás não me conhecia, pegaria na minha mão e iria comigo, seu salvador e seu herói, aonde quer que eu fosse.
O meu tempo acabou e o inesperado aconteceu. Camille me traiu e, com um simples gesto, acabou com todas as boas intenções e planos que eu havia reservado para ela. Com seu gesto, ela apagou o seu passado e voltou para sua existência primeira, aquela cuja trajetória eu tomava parte apenas num pequeníssimo espaço.
Camille virou as costas para a sua vida que somente eu conhecia e desapareceu na escuridão do outro lado da ponte.
Talvez ela estivesse somente curtindo a onda se seu baseado; sua vida nem devia estar ruim e, acima de tudo, ela não precisava de uma outra história.

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