9 de jun. de 2010

A vida bate


Por Thiago Lopes de Freitas


Ao ler o poema "A vida bate", de Ferreira Gullar, sabendo que teria a incumbência de desenvolver algumas linhas que tratassem das minhas impressões e sentimentos, prontamente comecei a buscar o que havia produzido sentido em mim. Observei as palavras, a maneira que as idéias foram construídas e ensaiei escrever algumas coisas. Contudo, nada me satisfazia. Pensava em palavras soltas, coisinhas bobas. Definitivamente, nada parecia ter feito muito sentido. Talvez um pouco de preconceito, pois tive a oportunidade de conhecer o tal escritor pessoalmente e na ocasião o achei um grosseiro. De qualquer maneira, estava demasiadamente irritado já que deveria apresentar alguma resolução para a proposta que me fora feita.
Desisti de escrever. Muito barulho. Não conseguia me aprofundar no que esse “tal Gullar” queria dizer. A televisão dava destaque para a chuva que provocou desastres no Estado do Rio de Janeiro. A contagem dos mortos passava dos 130 no município de Niterói. Confesso que nesse momento, a notícia me dizia mais do que o poema do decrépito Gullar. A televisão, o barulho das pessoas em casa e o ruído de um culto pentecostal vindo da rua tiravam a minha atenção. Batia o nervoso, pois o domingo seria o último dia hábil que teria para realizar a atividade. A segunda e a terça seriam cheias. Como é ruim ter que associar tempo, responsabilidade e sentimento. Ler e refletir sobre o que se lê não necessariamente é um processo sucessivo, principalmente tratando-se de um poema. Às vezes precisamos parar, fazer outras coisas, conversar com alguém ou simplesmente dormir para “compreendermos” tamanha subjetividade Pensei como deve ser ruim a vida de um crítico profissional de arte, cinema, literatura. Tudo bem que a minha função não era fazer uma crítica, mas mesmo assim. Ninguém aceitaria que o poema não provocou nada em mim. Tampouco eu aceitaria. Acredito que a indiferença é um dos piores males da humanidade, por isso necessitava produzir alguma coisa escrita. Mas depois da televisão, corri para o videogame. Na verdade, um emulador para PC, mas o meu Super Mario World era o mesmo da infância. Joguei bastante e fui para a cama. Aproveitei o “pré-sono” para namorar um pouco. Faz parte.
Mas o tal poema do Gullar não saía da minha cabeça. Revirei meu corpo para tudo que era lado da cama. Estava incomodado e fui ler o poema novamente. Aproveitei que já passava das 2 da manhã e o silêncio reinava. Ao ler, espantei-me. Palavras como homem, vida, fome, buscam, amor, cidade, refúgio, se misturavam num belíssimo arranjo poético. Pareciam carregar o valor espiritual do poema. Comecei a pensar no homem urbano e a busca incessante por vida. Como se tivesse fome de viver. A cidade, embora seja o refúgio social, econômico e cultural dessa criatura, é uma organização esquizofrênica. Pessoas indo de lado a outro, sem ao menos falar “Bom dia”. Ricos, pobres, pessoas saudáveis, outras doentes, gente que conseguiu um bom emprego e gente que perdeu tudo. Todos caminham, se cruzam nos sinais, pegam ônibus, se encontram em filas de banco, em terminais, na praia, shoppings, teatros, concertos, estradas, avenidas, praças, museus, universidades, parques, boates, botecos, galerias aaarrrggghhh...! O Gullar era como eu. Um sujeito citadino, que observa esse fluxo de gente que vai e volta, anda, para e retorna. Gente que busca viver das mais diferentes maneiras. Que busca meios de realizar seus projetos e ter uma vida realmente ativa, tentando se afastar da solidão e produzir sentido para si.

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